A
professora Antonieta, com os seus 83 anos, é a minha consultora preferida para
assuntos do ensino primário durante o Estado Novo e os anos 70 a 80 já em
democracia.
Das
muitas conversas, tem sobrado imensa informação solta de que tomo notas e que julgo
uma pena perder-se. Algumas dessas notas transcrevo-as aqui, sob a forma de
memórias dispersas que a própria reviu. Optou-se por manter o tom coloquial.
“No
ano de 1952 exerci pela primeira vez a minha profissão de professora. Foi numa
escola da Moita com uma 4ª classe.
As
meninas frequentavam a escola da parte da tarde. De manhã eram os rapazes.
Os
alunos podiam frequentar a escola primária até aos 14 anos, havendo por isso
alunas com 11,12 e mais anos.
A
ligação professora- aluna era na maioria dos casos muito complicada. Não havia
à-vontade suficiente para a aluna se entregar. Sempre uma distância enorme.
Existia
um silêncio obrigatório considerado o ideal para o ensino funcionar bem. Havia
professores que recusavam a existência de tal distância, e os que a conseguiam
ultrapassar com muito amor deixaram uma recordação maravilhosa nos seus alunos
para toda a vida.”
(…)
“Ensinavam-se
todos os aparelhos do corpo humano menos o reprodutor.
Certa
vez, uma das alunas mais velhas faltou à escola durante uns dias. Quando
regressou eu quis saber a razão das suas faltas mas ela só dizia que a mãe
estivera doente. Á hora do recreio uma aluna veio-me dizer que ela faltara à
escola porque tinha ajudado a mãe a ter um bebé e estava a mentir.
A
verdade soube-a depois. O pai trabalhava de noite, or irmãos eram pequenos,
estavam a dormir e a mãe pediu-lhe ajuda.
Falámos
então na aula com todo o cuidado e simplicidade sobre o que ela tinha dito. Só
uma aluna tinha visto nascer um bezerrinho.
No
dia da vinda do padre à escola, ele perguntou-me o que tinha acontecido porque
a mãe de uma aluna tinha dito que a professora tinha falado de coisas feias em
vez de dar aulas.
Foi
difícil mas valeu a pena. O próprio padre concordou comigo.”
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