27 março 2020

A "Guerra" do Bacalhau


     O meu avô materno chamava-se António Soares Baptista, nasceu a 28 de dezembro de 1939 e faleceu a 17 de setembro de 2014.
        Aos 18 anos de idade o meu avô teve de fazer uma escolha muito importante na sua vida: cumprir o serviço militar ou ir para a pesca do bacalhau.
       A sua opção foi ir para a pesca do bacalhau onde andou durante 9 anos em vários navios passando por grandes tormentas.
       Atualmente, o meu avô, o meu bisavô e outros familiares encontram-se nos registos dos “Homens e Navios do Bacalhau” no Museu Marítimo de Ílhavo e no Museu da Marinha.


Ainda antes do Estado Novo, em 1927, foi promulgada a primeira legislação pelos Governos da Ditadura Militar que isentava de serviço militar os pescadores que fizessem seis campanhas consecutivas na Terra Nova.
Mais tarde, a forte vaga de emigração dos anos 60, a natureza obsoleta da pesca à linha, no período coincidente com as guerras coloniais em África, fizeram com que surgissem sérios problemas de recrutamento. Era difícil formar as tripulações por falta de mão-de-obra. O decreto de 1927 voltou a ser importante e “proporcionou a muitos homens um dilema humano que hoje nos impressiona: embarcar num bacalhoeiro e escapar ou ir para a guerra de África.





“Naquele tempo, quem fosse para o bacalhau não ia para Angola, havia lá a guerra”.

          Nas palavras de Zé Miguel, antigo pescador da pesca do bacalhau: “A bordo iam cerca de 65 homens”. As viagens ao bacalhau eram campanhas sazonais, cerca de seis meses, entre abril e outubro. “Dormíamos dois a dois e a comida era sempre a mesma coisa: chá ou leite feito de pó, grão, feijão e batatas. Foi assim a vida”, desabafa. 
        Era no rancho, à proa do navio, onde se comia e dormia. Os pescadores dormiam vestidos, dois a dois normalmente por relações de parentesco e o fogão estava sempre acesso para aquecer os homens. Havia falta de água potável, “tínhamos uma caneca de água por dia, para lavar a cara, as mãos e para beber”.
     Os problemas de saúde eram frequentes e os homens trabalhavam “até aos limites quando havia peixe e o tempo o permitia, era um esforço sobre-humano”, afirma Álvaro Garrido(consultor do Museu Marítimo de Ílhavo)
   Esse trabalho permitia-lhes “a possibilidade de um rendimento fixo e regular que as outras pescas não davam”, explica-nos. Para a economia e vida social das comunidades marítimas portuguesas, “foi um modo de vida importante que reflete bem o atraso do país, a miséria social que grassava nas comunidades dos pescadores”.
     Zé Miguel ainda se lembra do seu primeiro ordenado, “foi 20 escudos por um quintal de bacalhau” ou seja, 12 mil quilos de bacalhau.

                    David Calado 9º G


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